Evento reuniu lideranças, estudantes e instituições, e marcou a primeira exposição do maior acervo sobre as comunidades quilombolas do Tocantins
Por Geíne Medrado
A Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO) e a organização Alternativas para a Pequena Agricultura no Tocantins (APA-TO) realizaram, na última sexta-feira (13), a primeira exposição do maior acervo de materiais produzidos sobre as comunidades quilombolas do estado. A atividade integrou o seminário “Direito à Terra e Memória Quilombola: Saberes em Movimento”, realizado no auditório da Reitoria da Universidade Federal do Tocantins (UFT), em Palmas.
Promovido pela Clínica de Direitos Humanos Dona Raimunda Quebradeira de Coco (CDH/UFT), o evento reuniu lideranças quilombolas, estudantes, representantes do poder público e pesquisadores para discutir os desafios enfrentados pelos territórios quilombolas no Tocantins. A proposta foi fortalecer o debate sobre os direitos territoriais, a luta por justiça social e a valorização da memória coletiva.
Participaram do seminário instituições como a Defensoria Pública do Estado do Tocantins, o Ministério Público Federal, a Secretaria dos Povos Originários e Tradicionais, a Secretaria da Igualdade Racial (SEIR) e a Secretaria de Cidadania e Justiça (SECIJU), além da Rede de Cidadania e Direitos Humanos (RCDH).
Para Maria Aparecida de Sousa, coordenadora executiva da COEQTO, o seminário foi um momento importante de formação e aproximação com a Universidade. “Foi uma oportunidade de aproximar a universidade das comunidades quilombolas e apresentar os desafios que enfrentamos, principalmente na regularização fundiária. Também mostramos nosso acervo de materiais, que é uma produção diversa e essencial para a compreensão dessa realidade”, afirmou.
O Tocantins conta com mais de 45 comunidades quilombolas certificadas, mas apenas uma possui o título da área. A maioria enfrenta dificuldades como conflitos fundiários, falta de políticas públicas e acesso precário a serviços básicos como água, energia, saúde e educação.

Diante desses desafios, Érica Lopes da Silva, vice-presidente da comunidade Barra da Aroeira, destacou a resiliência das comunidades. “Passamos por muito preconceito e racismo, mas seguimos ensinando nossas crianças, cantando e dançando. Viemos pedir que o poder público nos olhe com mais respeito e sensibilidade. Só queremos dignidade”, declarou.
Para José Miguel Nunes da Silva, acadêmico de Direito e membro da CDH, o evento reforçou o papel da universidade como espaço de diálogo com os territórios tradicionais.“Foi importante construir esse espaço com as comunidades. Além do conhecimento, queremos oferecer apoio e visibilidade”, disse.
A acadêmica de Direito Giovanna Ferreira, integrante da rede Br Cidades e da organização do seminário, destacou o caráter mobilizador do encontro. “Nosso objetivo foi acender uma chama nos estudantes para refletir sobre as comunidades mais negligenciadas e o papel do Direito na transformação social”, explicou.
Exposição inédita reúne produções quilombolas e fortalece memória coletiva
Durante o seminário, foi realizada a primeira exposição pública do acervo de materiais produzidos pela COEQTO e APA-TO ao longo de mais de 12 anos de atuação junto às comunidades quilombolas do Tocantins. A mostra reuniu cartografias sociais, planos de gestão territorial, cartilhas, mapas e outras publicações, que documentam as lutas, os saberes e os modos de vida dos quilombos.
Considerado o maior acervo sobre comunidades quilombolas do estado, o material também está disponível para consulta e download gratuito no site da COEQTO, sendo uma ferramenta essencial de preservação e valorização da cultura quilombola.

Entre os destaques do evento está o relato de Dona Isabel Rodrigues, liderança da comunidade Barra da Aroeira e uma das fundadoras da COEQTO. Com trajetória na Coordenação Nacional de Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), ela foi a primeira representante do Tocantins na organização. “Tenho orgulho de ver esses livros que ajudamos a construir, com nossas histórias e nossas fotos. São registros que falam das nossas lutas e também do sofrimento vivido pelas comunidades”, relatou.

A proposta é que a exposição circule por outros espaços, levando a memória e a produção das comunidades a públicos diversos, como destacou Paulo Rogério Gonçalves, da APA-TO. “Esses materiais retratam as realidades e saberes das comunidades. É fundamental que essas produções, que trazem o reconhecimento das vozes quilombolas, sejam levadas para outros espaços, especialmente aos acadêmicos, que muitas vezes desconhecem essa riqueza”, defendeu.
Os materiais estão disponíveis para acesso gratuito no site da COEQTO.