Quilombo se formou em 1888, junto com a abolição da escravatura. Comunidade que aguardava a titulação se preocupa com conflitos por causa do território.
O território quilombola Ilha de São Vicente, em Araguatins (TO), recebeu, nesta segunda-feira (20), o Título de Concessão de Direito de Uso sobre a Terra. O documento foi entregue pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao quilombola Cantídio Barros Filho, representante da Associação da Comunidade Quilombola localizada no Rio Araguaia. O documento significa que a comunidade quilombola é a única responsável legal pelo território.
O título conjunto em nome da Associação da Comunidade, dá direito ao uso da terra e não permite que o território seja vendido, continuando a lógica ancestral, de que o espaço seja ocupado por diferentes gerações. É um título gratuito e com força de escritura pública. As famílias ganham segurança jurídica para desenvolver atividades produtivas, evitando que os lotes sejam objeto de negociatas e da especulação imobiliária, como vinha ocorrendo.
A comunidade quilombola Ilha de São Vicente e a Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO) reconhecem que esse é um avanço, mas ainda entendem que o Estado Brasileiro precisa garantir os direitos dessas famílias. A entrega do título não resolve os problemas que a comunidade enfrenta, como a falta de água potável, de acesso à saúde e educação dentro do território.
No Tocantins, dos 48 territórios Quilombolas apenas 06 possuem avanço no processo de titulação de seus territórios, tendo portaria de reconhecimento publicada pela União, são eles: Ilha de São Vicente; Kalunga do Mimoso; Lageado; Barra do Aroeira; Cocalinho e Grotão. As demais comunidades possuem apenas a certificação pela Fundação Cultural Palmares e aguardam início do processo de titulação pelo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).
A comunidade continua sofrendo com as invasões e os conflitos contra o quilombo Ilha de São Vicente existem por causa do território. Atualmente as famílias quilombolas, que já tinham a posse do território, são intimidadas por pessoas não quilombolas que ocupam o território de forma ilegal. Por causa das intimidações e da sensação de insegurança, as lideranças temem situações violentas.
Os grupos que moram no território quilombola ilegalmente, contestam a Secretaria de Patrimônio da União (SPU) sobre a destinação das terras à comunidade quilombola da Ilha de São Vicente, mesmo já tendo sido comprovado judicialmente que a posse pertence às famílias quilombolas.
Diante da situação de insegurança, a COEQTO discute, junto às autoridades, medidas de proteção para as famílias da comunidade.
A história do quilombo
A comunidade quilombola Ilha de São Vicente, cercada pelo Rio Araguaia, fica na região do Bico do Papagaio e possui mais de 70 famílias descendentes de escravizados. A comunidade enfrenta a negação de seus direitos desde a época do surgimento do quilombo, em 1888.
Desde sua fundação, a comunidade sempre sofreu com ataques por conta de conflitos pela terra e foi defendida pelos descendentes quilombolas, como Salvador Barros e Fátima Barros que já faleceram. Os dois foram importantes lideranças e sonhavam viver tranquilos dentro do território titulado.
A comunidade Quilombola Ilha de São Vicente surgiu em 1888, época que coincide com a assinatura da Lei Áurea. Seus primeiros habitantes foram oito negros, comprados em Carolina, no Maranhão, trazidos da África para o trabalho escravo no Brasil. Na época, após a abolição da escravatura, eles receberam a terra como uma doação e começaram a povoar o território. Os ex-escravizados constituíram a família Barros, que também perpassa pelos ancestrais indígenas (os Araras e os Curi Araras) e a família Noronha.
- Conheça aqui a história da comunidade quilombola: https://coeqto.com.br/2023/06/06/comunidade-quilombola-ilha-de-sao-vicente-em-araguatins-to-aguarda-conclusao-de-processo-de-regularizacao-territorial-conheca-a-historia-do-quilombo/
Em 2019 a comunidade recebeu, da Justiça, a posse do território, e em 2020 a comunidade foi reconhecida como quilombo pelo Governo Federal. Na época, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) publicou a portaria Nº 1.080, que “declara como terras da Comunidade Remanescente”. (Entenda abaixo a linha cronológica)
Em 2019, a Justiça Federal julgou uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal, garantindo à comunidade quilombola Ilha de São Vicente o direito à posse da terra.