Por Geíne Medrado
Imagem de capa: Lideranças quilombolas do território Claro, Prata e Ouro Fino olhando o mapa da do território com em setembro de 2022 | Foto: Maryellen Crisóstomo
Nesta quinta-feira, 20, foi realizada reunião entre a Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO) e o Ministério Público Federal (MPF), com o intuito de acompanhar as movimentações dos processos, que tramitam na comarca de Gurupi, referentes às questões vivenciadas por quilombolas da região sudeste, onde se concentra o maior número de comunidades que enfrentam conflitos territoriais no Estado do Tocantins.
As discussões se concentraram especialmente em torno dos processos a respeito do quilombo Baião, no município de Almas, que vive sob os impactos da mineração; Brejão, em Natividade, e Claro, Prata e Ouro Fino, em Paranã, comunidades que, atualmente, têm sofrido situações de extrema violência, com aumento de casos de incêndios e invasões de suas propriedades por parte de grileiros e latifundiários.
Sobre a situação do Baião
A comunidade Baião, antes da instalação da Mineradora Aura Almas Mineração LTDA, solicitou ao MPF de Gurupi um acompanhamento do empreendimento para que fosse respeitado os limites territoriais do quilombo e a fim de evitar possíveis impactos ambientais e sociais. Porém, o caso não recebeu a devida atenção das autoridades competentes. Agora, com mais de um ano de atividade, a empresa segue explorando a região, sem ter elaborado o devido estudo de impactos ambientais.
“Uma das preocupações sobre a situação vivenciada no Baião é em relação aos aspectos hídricos. A comunidade já sofre com a questão da falta de água. E com o avanço da mineradora, esse problema se intensifica, o que pode inviabilizar a permanência da comunidade na região”, analisou o assessor jurídico da COEQTO Cristian Ribas.
Diante do caráter de urgência da situação, em setembro de 2021, a comunidade realizou uma denúncia junto ao MPF, solicitando a intervenção do órgão no andamento da implementação da mineradora. O principal ponto defendido pelas lideranças é o direito da consulta livre, prévia e informada com amplo acesso aos estudos de impactos do empreendimento, assegurando aos próprios quilombolas apontarem o que avaliam que seja melhor para a comunidade.
O Protocolo de Consulta Pública do Baião foi concluído em 23 de julho de 2022, sendo anexado ao processo contra a mineradora. Todavia, o juiz responsável pelo processo indeferiu o pedido de ação civil pública que obrigasse a mineradora a acolher o protocolo de consulta elaborado pela comunidade, com a justificativa de que não há fatos novos no processo.
“Porém, esses fatos novos dependem do recolhimento das licenças da mineradora junto aos órgãos ambientais, o que ainda não foi feito, visto que esses órgãos não responderam aos ofícios encaminhados pelo juiz”, explicou Cristian Ribas. Em 05 de agosto, o MPF despachou ofícios para a Agência Nacional de Mineração, Fundação Cultural Palmares, ao INCRA e ao NATURATINS para que fornecessem, dentro do prazo de 10 dias, as informações requeridas. Entretanto, os órgãos notificados não respeitaram o prazo estabelecido. O MPF segue aguardando as respostas para que haja andamento no processo.
Brejão
A comunidade Brejão denuncia o avanço do desmatamento, além do aumento dos casos de violência praticada por fazendeiros em seus territórios, que têm evoluído de intimidações e ameaças para morte de animais e casas incendiadas.
“Essa semana tivemos mais um caso de incêndio lá, aconteceu na casa de uma das lideranças. Temos observado que essa prática criminosa está ocorrendo com bastante frequência no Brejão e também em outras comunidades do sudeste do estado como Formiga, Carrapato, Ambrósio, Claro, Prata e Ouro Fino”, relatou Maria Aparecida de Sousa, coordenadora executiva da COEQTO.
Felizmente, o quilombo Brejão teve uma recente conquista no processo de regularização do seu território, tendo enfim recebido a certificação de reconhecimento da comunidade, emitida pela Fundação Cultural Palmares. A expectativa é que essa certificação seja incluída no processo do Brejão para contrapor às contestação dos fazendeiros em relação à “não existência” da comunidade na região.
Claro, Prata e Ouro Fino
Diante do avanço do desmatamento e embates com grileiros e latifundiários, as lideranças do quilombo Claro, Prata e Ouro Fino acionou o MPF requerendo que fosse realizada a identificação da área desmatada que adentra no território quilombola. Além disso, foi adicionado ao processo, o caso recente de incêndio que ocorreu, há três semanas, em uma casa na comunidade.
O órgão está trabalhando nas coordenadas geográficas da região para identificar a área do desmatamento.
Encaminhamentos
A COEQTO entende que a situação vivenciada pela comunidade Baião deve receber uma atenção com caráter de urgência pelas autoridades competentes, já que a mineradora está trabalhando há mais de um ano no município de Almas, o que sem o devido controle, pode ensejar danos irreversíveis à comunidade.
“Nós não temos estafe jurídico para lidar com a amplitude do problema enfrentado pelo Baião e estamos muito preocupados com a forma como o MPF tem tratado a situação, que demanda uma solução urgente. A comunidade precisa de respaldo do órgão. Nós entendemos que o MPF tem o dever de processar o pedido de consulta prévia, efetuado pelo Baião”, argumentou o assessor jurídico da COEQTO, Cristian Ribas.
Para tentar agilizar o andamento no processo do Baião, o MPF está cobrando as respostas dos órgãos ambientais notificados em 5 de agosto de 2022, para que, então, seja realizada deliberação acerca da necessidade de estudo antropológico, a fim de apurar se há, de fato impactos ambientais decorrentes da atividade minerária sobre a comunidade quilombola.
A respeito do Brejão, existe uma Ação Civil Pública em andamento, com última movimentação realizada no final de setembro pela comarca de Gurupi. Será juntado ao processo, o certificado de reconhecimento da comunidade quilombola Brejão, emitido na última semana.
Em relação ao caso de desmatamento e incêndios criminosos no Claro, Prata e Ouro Fino, agora o processo passará a ser tramitado na comarca de Palmas.