Lideranças quilombolas do Jalapão denunciam violações de direitos no processo de concessão do Parque por parte do Governo do Tocantins

Comunidades tradicionais não são ouvidas e denunciam pressão do Estado

Em carta aberta à sociedade, a Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO) e as entidades que a subscrevem, denunciam violações no processo de concessão do Parque Estadual do Jalapão. As lideranças têm recebido pressões do Governo do Estado para participarem de reuniões marcadas com prazos exíguos, sem comunicados oficiais às associações que, ao questionarem a inviabilidade de participação ampla da comunidade, os representantes do Estado começam a fazer ligações para pessoas isoladas a fim de garantir quórum nas reuniões.

Segundo o presidente da ASCOLOMBOLAS Rios, Joaquim Neto, a situação de desrespeito às comunidades tradicionais do Jalapão se repete como aconteceu no processo de instalação do Parque. “Assim como a gente não teve direito à voz no processo de criação do Parque, agora o processo de concessão está sendo pior”, alerta.

À medida que o Estado avança no processo de concessão dos Parques, os povos impactados são cada vez mais relegados dos espaços de discussões. “Não nos procurou no processo de criação da lei dessa concessão dos Parques. Quando nos é procurado para dar a nossa opinião, eles vêm com um cronograma de reunião em que não dá tempo para nós mobilizar todo o nosso pessoal e também não dá tempo para a gente se articular para que nós tenhamos um acompanhamento de técnicos da área jurídica que defendam os quilombolas ou até do Ministério Público que às vezes é interessante participar”, relata Joaquim Neto.

No próximo dia 16 o Governo do Tocantins por meio da ADETUC vai ao Jalapão com o BNDES para realizar uma reunião em que as associações foram comunicadas com dois (2) dias de antecedência. 

“Estamos lançando uma carta em que manifesta toda a nossa preocupação de indiferença do Estado em querer que a gente reúna em tempo muito ligeiro. Estamos muito preocupados e aflitos com as ações que o Estado está tendo conosco, nos impondo reuniões em datas não programadas e sem adiantamento da pauta. Queremos que nos envie o comunicado formalmente e que a gente aceite formalmente para que a gente não seja prejudicado”, ressalta, a liderança.

CARTA ABERTA À SOCIEDADE TOCANTINENSE

Palmas, 14 de setembro de 2021. 

As comunidades quilombolas do Jalapão, suas associações e as entidades de apoio subscritas abaixo, vêm expressar a imensa preocupação com a ausência de consulta e diálogo com as comunidades quilombolas e tradicionais durante o processo de aprovação e sanção da legislação que autoriza a concessão de Parques estaduais, entre eles o Jalapão, à iniciativa privada.

A vantagens financeiras da concessão não podem suplantar o bem-viver dos povos e comunidades que ali fizeram morada nos tempos de escravidão legal no Brasil. Os quilombos se formaram na Região do Jalapão bem antes da instalação do Parque Estadual que sobrepôs territórios quilombolas no início dos anos 2.000. Ao invés de demarcar os territórios e titular, o Estado do Tocantins desde a implantação do Parque, tem agido em prol de inviabilizar as vivências dos povos tradicionais no Jalapão. É preciso demarcar os territórios em respeito aos povos que convivem harmoniosamente com o Jalapão desde o final do século XIX. Os povos tradicionais não são considerados entre os índices de desenvolvimento econômico deste Estado e nisso, consiste a luta pelo acesso pleno à terra e ao território e contra políticas excludentes.

As lideranças denunciam que as comunidades estão sendo convocadas pelo Governo do Estado do Tocantins para reuniões, definidas de forma unilateral e reiteradamente, não concedendo às comunidades nem mesmo o direito de opinarem sobre datas e horários. 

Tal situação viola frontalmente o artigo 6º, 1 e 2 da Convenção n. 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário, e que impõe ao Estado o dever de consulta prévia, livre e informada às comunidades tradicionais sobre as medidas administrativas e legislativas suscetíveis de afetá-las diretamente, bem como assegurando sua participação na adoção de decisões. 

Assim, considerando o delicado contexto atual e com o objetivo de assegurar os direitos das comunidades, exigimos que a partir de agora, qualquer reunião das

secretarias ou outro órgão do Estado, deverão ser solicitadas junto às associações através de ofícios encaminhados em nome de seus presidentes, com o prazo mínimo de 20 (vinte) dias de antecedência para assegurar a ampla participação das comunidades impactadas. Na ocasião, também deverão apresentar as pautas a serem discutidas. 

Solicitamos ainda que o Governo do Tocantins apresente uma agenda de discussões e inicie o debate para assegurar a demarcação e titulação dos 38 territórios quilombolas do Estado. Que o Estado apresenta o estudo sobre os impactos da demarcação territorial, por ele solicitado, para a tramitação e aprovação do texto da Lei de demarcação territorial encaminhado ao Governo pelo Ministério Público Federal, há  mais de cinco (5) anos.

Ademais, com relação a solicitação de comunicados prévios das reuniões no âmbito da concessão do Parque Estadual do Jalapão, a reivindicação se faz necessária para evitar que as associações e comunidades continuem sendo surpreendidas com reuniões repentinas, sem comunicado oficial prévio, sem adiantamento de pauta, sem oferecer tempo hábil para as associações mobilizarem suas comunidades e garantir ampla participação de todos, como está acontecendo nesse exato momento, onde pessoas da comunidade estão sendo convidadas de maneira individual para reunião com ADETUC e BNDES e não se sabe para qual pauta.

Vamos falar de demarcação territorial?

Em defesa da vida, dos territórios e do Jalapão!

Assinam esta carta

:

Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO)

Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ)

Associação Quilombolas Carrapato, Mata, Formiga e Ambrósio – Presidente: Jussara Tavares Da Silva

Associação das Comunidades Quilombolas das Margens do Rio Novo, Rio Preto e Riachão (ASCOLOMBOLAS RIOS) – Presidente: Joaquim Neto Almeida de Souza

Associação Comunitária dos artesãos e pequenos produtores de Mateiros – Presidenta: Laudeci Ribeiro de Sousa Monteiro

Associação Comunitária dos Extrativistas Artesãos e pequenos produtores da Comunidade Quilombola do Prata – Presidente: Aulerinda dos Passos Ribeiro

Alternativa para Pequena Agricultura no Estado do Tocantins (Apa-to)

Articulação Tocantinense de Agroecologia  (ATA)

Conselho Indigenista Missionário – Regional Goiás/Tocantins (CIMI)

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)

Fórum da Amazônia Oriental (FAOR)

Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB)

Comissão da Pastoral da Terra (CPT)

Terra de Direitos

Central do Cerrado

Coalizão Negra Por Direitos

Articulação Rosalino e movimento Geraizeiro

Conselho Nacional das populações extrativistas – CNS Regional Tocantins

Associação das Mulheres Trabalhadoras rurais do Bico do Papagaio (ASMUBIP)

Centro de Trabalho Indigenista

Campanha Nacional em Defesa Cerrado

Grupo Carta de Belém

Angá – Associação para a gestão socioambiental do Triângulo Mineiro

Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE)

Associação Agroecológica Tijupa

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